Pelo jeito, o estresse deverá chegar ao fim. Não porque, finalmente, teremos empresas e mercados mais equilibrados, onde a pressão por resultados deixará de existir, mas sim, porque as pessoas não querem mais viver dessa forma.
Por Wilson Ziolli
27 de setembro de 2019.
Faz muito tempo, que a empresas vivem sob a pressão por resultados positivos e surpreendentes. Ano após ano, tentam com criatividade e com gestão, aumentar seus lucros de forma sustentável e ser dominante no mercado em que atua. Consequentemente, tal pressão é refletida nas equipes, onde as empresas tentam compensar a pressão e o estresse gerado aos colaboradores com bônus ou outros benefícios financeiros, a fim de compensar ou motivar os resultados alcançados e as horas de trabalho dedicadas à empresa. Até hoje, essa fórmula dá resultados, porém parece que ela terá, que ser revista em breve, pois após algumas gerações, os interesses das pessoas mudaram e o objetivo atual é bem diferente do anterior. As pessoas, hoje, se interessam menos por dinheiro e por posses e desejam mais qualidade de vida.
Essa tendência é uma consequência do movimento natural da evolução econômica e social, que sofremos nas últimas décadas. Como foi mencionado em “Y+Z = o desafio da gestão”(1), cada geração surge sobre as consequência da geração anterior. Por exemplo, a Geração Y pode ser disruptiva, porque a Geração X conseguiu aproveitar a globalização econômica e a criação da internet, juntamente, com as possibilidades, que estas geraram. Dessa forma, as gerações aparecem e deixam suas contribuições para as futuras gerações. Hoje, estamos a beira de um mundo VUCA (Volátil, incerto, complexo e ambíguo, numa tradução livre do termo em inglês), gerado pelo movimento disruptivo promovido pela Geração Y e pela Z, mas, também, pela revolução tecnológica, que está se iniciando. Além de todas essas consequências e outras já discutidas em outros artigos, há um importante movimento, que vem ganhando força entre as pessoas, o fim do estresse e o foco na qualidade de vida.
Para entendermos melhor esse movimento, vamos entender a conduta das empresas nas últimas décadas. Há muito tempo já se sabe, que as pessoas conseguem ter um rendimento muito superior sob estresse. Obviamente, que há um limite e, por isso, o desafio da gestão era conseguir equilibrar o nível de estresse do colaborador a ponto de se obter o melhor rendimento, de modo a não esgotá-lo. Trata-se de uma linha de gestão ainda amplamente utilizada e com excelentes resultados, que está baseada em um comprometimento total do colaborador, que é recompensada por um retorno. Até então as gerações ainda acreditavam, que a qualidade de vida era obtida através de uma estabilidade financeira, ou seja, com dinheiro eu posso ter os bens e os serviços, que eu desejo para mim e para a minha família. Quanto mais dinheiro, mais qualidade de vida. Então, através dessa crença, as empresas sempre tinham pessoas querendo mais resultados, melhores posições, o que fazia movimentar esse ciclo, que podemos nomear de ciclo de produtividade sob estresse: mais resultados - mais retorno – mais tempo dedicado. Depois de muito tempo, muitos resultados positivos foram alcançados, porém muitos fracassos corporativos ou pessoais surgiram. A pressão e o estresse foram crescentes, apesar das empresas buscarem uma série de alternativas para tentar equilibrar esse ciclo, a fim de não atingir uma ruptura. Contudo, hoje, já temos indícios que esse dia irá chegar e, talvez, antes do que todos imaginavam.
Devido a todas essas transformações, que estamos vivendo, os objetivos pessoais vem se alterando. Aquele mundo louco de 12 horas de trabalho, às vezes, sem finais de semana, sem férias, ou seja, sem vida pessoal... estão com dias contados. Isso vem acontecendo tanto com as pessoas mais bem sucedidas, quanto com as “não tão bem sucedidas”. Há vários motivos para que esteja acontecendo esse movimento e desejo. Vamos enumerá-las:
O mercado vem sofrendo uma grande transformação. Hoje, ele é muito mais voltado ao compartilhamento dos bens, do que à aquisição. Dessa forma, a importância de comprar um imóvel ou um bem, perdeu a importância. Hoje, eu utilizo Uber e AirBnB, ao invés de comprar um carro ou um apartamento;
O aumento das doenças e síndromes relacionadas ao estresse e ao controle emocional, como depressão e burnout vem aumentando rapidamente. A ponto de serem consideradas as doenças do século;
A qualidade de vida não está mais relacionada a estabilidade financeira. O mundo hoje está muito mais acessível. Mais pessoas falam inglês, ao mesmo tempo, que em breve, os tradutores estarão mais eficientes, ou seja, a língua não é mais uma barreira. A internet está mais acessível, em muitos países, há muitos mais celulares conectados, do que habitantes. Pessoas de todas as classes têm acesso a smartphones. Viajar está mais fácil hoje, do que 20 anos atrás. Todos estes pontos estão relacionados a bem estar, a tranquilidade, ou a diversão, isto é, períodos sem obrigação ou responsabilidades;
As pessoas não acreditam mais, que se doar para uma empresa, seja a melhor forma de se atingir os objetivos pessoais. Trabalhar somente 8 horas por dia, ou até menos, é muito mais interessante e significativo, do que virar a noite, ou perder um final de semana. A recompensa financeira por se dedicar muitas horas ao trabalho, não é mais tão interessante. Hoje, não há mais a necessidade de se ter grande quantidades de dinheiro para se conhecer outros países, ou vivenciar novas experiências;
As nossas gerações não foram preparadas para atuar sob forte estresse, elas cresceram com outros tipos de dificuldades. Nas gerações anteriores, bens ou serviços eram restritos. Alguns cresceram sem energia elétrica, ou sem ter condições de fazer uma faculdade. As gerações mais recentes cresceram sob a pressão da diferenciação, ou seja, de serem diferentes, se destacarem e não por restrição, o que gera consequências diferentes e não tão resistentes ao estresse por longa duração;
Ter qualidade de vida é o mais importante hoje. Para isso, ambiente amigável de trabalho, baixo nível de estresse, poucas horas de trabalho tem mais importância. Perder um emprego hoje, pode não ter o mesmo peso que antigamente, pois não preciso mais ser um diretor, ou mesmo um gerente para ter bem estar, portanto a recolocação pode ser mais fácil.
Todos esses movimentos são percebidos no nosso dia a dia. Facilmente, lembramos de pessoas, que tenham comentado algum desses itens em um momento de desabafo, ou numa discussão de opiniões. Muitos buscam hoje encontrar esse equilíbrio, onde consiga conciliar a vida pessoal com a vida profissional, sendo feliz em ambas. Com isso, as empresas já não estão mais conseguindo manter o ciclo de produtividade sob estresse. Os colaboradores não querem mais passar por um período longo de estresse. Elas acreditam que a produtividade, hoje, venha mais através de um ambiente cooperativo, amistoso e, que valorize a qualidade de vida. Isso não quer dizer, que a liberdade total e a falta de pressão seja o caminho. Já percebemos, que esse tipo de linha não traz bons resultados no longo prazo. As empresas mais tecnológicas, ou as startups, tentaram um ambiente totalmente livre de padrões, como: vestimentas, horários e escritórios descontraídos, para que favorecesse a criatividade, porém vem recuando após alguns anos, devido a falta de resultados. Na verdade, a velha máxima do nem 8 e nem 80, funciona muito bem neste caso.
Como muitos acreditam, o equilíbrio é a chave do sucesso. Porém, não quer dizer, que seja uma situação estável. O equilíbrio pode sofrer variações o tempo todo, atingir esse ponto e se manter sob um regime equilibrado é o grande desafio. Consequentemente, as empresas terão que se adaptar, também, para essa nova mentalidade dos colaboradores. A renumeração e as bonificações, exclusivamente financeiras, não são mais suficientes para cativar os colaboradores e obter os melhores resultados. Ainda mais, quando levam em consideração, que a criatividade é uma das chaves do sucesso das corporações.
Possibilitar ambientes criativos, colaborativos, além de um plano de retorno atrativo e flexível serão primordiais para se obter os melhores resultados de todos. Um exemplo, hoje em dia, já há empresas oferecendo um “cardápio” de bonificação. O colaborador escolhe, o que vai receber, caso atinja um certo resultado. Ele poderá escolher entre um bônus, ou mais dias de férias/folgas, ou ações, viagens ou etc. Outro exemplo, está relacionado ao fim das metas individuais, para que haja uma redução do estresse. As metas passam a ser por projeto ou por times, ou por ações e, também, sem um apelo punitivo.
Todas essas ações exemplificam o movimento, que as empresas vem realizando para alterar esse ciclo e propiciar um ambiente mais amigável ao colaborador, para que esteja mais motivado, menos suscetível ao estresse e depressão. Para que consiga ter um clima mais criativo e cooperativo de trabalho, ou seja, um ambiente positivo.
Atingir esse equilíbrio não será fácil e dependerá da maturidade de cada empresa. Como já mencionamos, a solução não está nos extremos da conduta, mas no equilíbrio. Às vezes, a empresa poderá gerar mais pressão aos colaboradores, porém, não nos níveis, que tínhamos até então. Ao mesmo tempo, que a empresa terá, que ser altamente produtiva nas suas operações dentro dos horários acordados com os colaboradores dos times. Não será fácil atingir esse nível em um mundo instável. As ações e reações terão que ser controladas de modo a atingir o equilíbrio entre trabalho e qualidade de vida frequentemente. Trata-se de um movimento, que acontecerá num longo prazo, mas que terá que ser feito, pois, caso contrário, não terá os melhores colaboradores para atuar nas suas dependências. O mundo atual está mais voltado às questões sociais e para as questões ambientais, onde a qualidade de vida é o grande objetivo. As pessoas não querem mais viver sob forte estresse, pois já entenderam, que não compensa.
Portanto, todos estes pontos terão que ser tratados de forma séria, caso as empresas queiram atrair os melhores profissionais e estar a frente do mercado. Terão que se adaptar a essa nova realidade e encontrar uma forma de atrair, reter e motivar seus colaboradores. Precisarão encontrar esse novo equilíbrio entre propiciar um ambiente de trabalho sadio e produtivo, com as metas e resultados essências para a saúde financeira de qualquer empresa. Este, também, será um movimento disruptivo e, quem entender e conseguir chegar neste ponto, será bem sucedido e aproveitará as melhores oportunidades.
Referências:
(1) “Y + Z = o desafio da gestão” – texto disponível no Blog TMC
Link: https://www.blogtmc.com